terça-feira, 17 de março de 2009

Level up

Parece que você não acerta nunca na vida. Apesar do universo utilizar um dispositivo chamado tempo, que permite que as coisas todas não aconteçam todas num instante só, sempre parece que há uma pilha de problemas na fila de espera, pronta pra lançar o próximo da lista. Daí que eu sempre entendi a vida como uma série de levels. Level um, a infância, dois, a escola primária, três, o ginásio, ad infinitum (aliás, nem tanto né, chega uma hora que você já tá no bônus faz muito). Mas quando é que eu vou ver a porra do grande chefão? Percebi então que o interessante não é usar aquele MP monstro e aniquilar tudo de uma vez, e passar todas as fases em dois dias. Porque esse jogo ninguém vence em dois dias, né, afinal, você continua vivendo um bom tempo, até seu ammo acabar, ou sei lá.
Mas pra que serve, então, esse super game de estratégia chamado Viver? Às vezes tô alí, de buenas com meu cigarritcho, e fico pensando nisso. Não no sentido da vida no geral, tipo “e Deus fez as minhocas e as formigas etc”, mas no sentido pessoal. Estudo pra trabalhar, trabalho pra viver, vivo pra... ahn... é... isso, vivo. Vivo? Sobrevivo? Existo? O cigarro termina, acendo outro, continuo a pensar. Continuo a pensar até a caixa acabar, porque esse não é bem o problema. Sinto-me como a formiga, que, ao andar sobre a laranja, muito espantada com uma pequena reentrância, que, pra ela, é tão grande como alguns buracos da Beira Rio, de repente pára e exclama consigo mesma: sinto cheiro de laranja! Eu, particularmente, sinto cheiro de algo mais pairando por aí, algum tornado atrás da porta, soltando brisas de vez em quando, e por isso mesmo tenho medo de usar muito o olfato.
Mas nem o tornado nem a laranja são os grandes chefões desse reality show chamado vida. Então quem é? E por que raios fica atirando tortas de lama contra moi? Você estuda, e estuda, e estuda, e adquire conhecimento, e mais, e mais, teoria alí, literatura acolá, doze anos na escola, (no mínimo) quatro na faculdade, e aí tá na área, vai chutar pro gol, passou o zagueiro e ahn.. cadê o gol? Time's up? Terminou? Mas já? Tava tão perto... Perto de quê? De revolucionar a escova de dentes elétricas? Pra quê? Ora, com dentes melhores, viveremos mais.
Que bonito, que bacana! Com dentes mais saudáveis, mais levels a cumprir. Mais estrada pra correr, mais indagação pra fumar, mais pergunta pra beber, mais incógnita pra cheirar. E você evolui, você digivolve, você acumula três páginas de currículo profissional, e ainda não sabe pra onde está indo. No final da vida não tem videozinho de três minutos explicando os segredos do jogo, e porque aquela policial bonitinha virou um demônio maligno e aniquilou a cidade. Os jornais continuam a não-explicar porque alguém mantém a filha em cárcere privado por 24 anos. Ou porque um garoto de 17 mata professoras e estudantes.
E eu olho pras criancinhas, todas elas bonitinhas, arrumadas em seus uniformes, brincando de Magic, ah, eles estão jogando Pokémon, que bonito, que saudade de Pokémon. Saudade de jogar jogos com regras fixas, explicadas, com objetivos, com certezas. Esse jogo aí que lançaram, essa tal de Viver, isso aí é uma bosta.

And through the holes they send us mugpies

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